sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

A Arca de Noé...


A tempestade tinha assustado a todos. Chuvas eram raras e quando vinham eram mansas. Mas naquele dia as águas caíram pesadas. As crianças ficaram com medo. Começaram a imaginar uma chuva que não teria fim, uma chuva que caísse sempre, que enchesse os vales e cobrisse tendas e árvores, uma chuva que trouxesse a morte para homens e animais. Foram à tenda de Benjamin e lhe contaram seus medos. E ficaram a olhar dentro dos seus olhos, já enrugados nos cantos pela idade, a longa cabeleira branca caindo sobre os seus ombros. E foi esta a estória que ele lhes contou:
            “Aconteceu, sim, faz muitos e muitos anos. Deus estava triste, muito triste com a maldade dos homens. Ao criar o mundo ele imaginara que os homens seriam felizes tantas eram as coisas bonitas que havia. O mundo era um jardim cheio de árvores, frutos, riachos, bichos amigos. Sendo felizes teriam de ser bons. Mas eles não ficaram bons. Ficaram maus. E, por causa da sua maldade – de onde ela teria vindo? – , a terra foi ficando feia e cobrindo-se de tristeza. Deus penso então em começar tudo de novo. Lavar o mundo da sua maldade, da mesma forma como se lava a roupa suja da sua sujeira. Tomou então a decisão de lavar o mundo com água. Chuva, muita chuva, chuva de dia, chuva de noite, chuva que encheria a terra e afogaria todo o mal.
            Mas havia um homem que havia permanecido bom, ele e sua família. Seu nome era Noé. Noé, agricultor, plantador de uvas, fabricante de vinhos... Deus então o fez sonhar. Pois é assim que Deus se comunica com os homens, fazendo-os sonhar. E ele sonhou com um dilúvio que cobria o mundo, o mundo inteiro transformado num mar sem fim e, flutuando no mar, um navio. Olhando mais de perto o navio, ele viu quem estava nele: ele mesmo e a sua família.
            Noé acordou assustado e contou o sonho para os seus filhos. ‘É uma revelação de Deus’, eles disseram. ‘Precisamos construir um navio para não morrer’. Ato contínuo, buscaram madeiras, tomaram ferramentas, serrotes, martelos, pregos e puseram-se a construir um navio que se chamava arca. Os vizinhos riam deles, achando que haviam endoidecido. Mas eles não ligaram. Continuaram o seu trabalho. Até que o navio ficou pronto. O céu já estava negro, coberto com nuvens sinistras. Os primeiros pingos começaram a cair. Noé  ordenou que sua família entrasse no navio.
            E os animaizinhos? Os animaizinhos não eram malvados, não mereciam morrer, disse um menino.
            “Não”, disse Benjamin com um sorriso. “ O navio era grande para todos eles. Assim, Noé ajuntou todos os animais seus amigos, ovelhas, cabritos, bodes, jumentos, cães, gatos, carneiros, bois, vacas, cavalos, galos, galinhas, patos, gansos, pombas, corvos...”
            “ E os coelhinhos?”, perguntou uma menina que tinha um coelhinho branco no colo.
            “Também os coelhinhos. Os peixes não, porque eles sabem nadar. Entraram todos no navio e Noé fechou a porta. E veio a chuva. Choveu durante quarenta dias e quarenta noites. Depois de quarenta dias parou de chover. As águas baixaram e as plantas ficaram verdes de novo. Mas Noé estava fechado dentro do navio. Não sabia o que estava acontecendo do lado de fora. Aí ele teve uma ideia: pegou um corvo e disse-lhe que voasse sobre a terra e lhe trouxesse informações sobre como estava o mundo. O corvo saiu, viu aquela beleza toda e se esqueceu de voltar para contar. Noé então mandou uma pombinha. A pomba foi, viu e voltou com um ramo de oliveira no bico. Noé compreendeu. O ramo de oliveira estava dizendo: ‘Está tudo em paz’. Desde então, as pombas passaram a ser o símbolo da paz”.
            “Mas, e se Deus resolver mandar outro dilúvio?”, perguntou um menino.
            Benjamin tomou as crianças e as levou para fora de sua tenda. Havia um enorme arco íris no céu.
            “Estão vendo o arco-íris com sete cores? Quando o dilúvio acabou, Deus pensou: ‘Agora os homens ao ficar com medo de outro dilúvio. Preciso dizer a eles que nunca mais um dilúvio destruirá a terra. Darei ordens ao Sol para que ele faça passar sua luz pela água da chuva, e faça um vitral de cores no céu. Sete cores. Esse vitral de sete cores, o arco-íris, será a minha assinatura nos céus, como garantia da minha promessa...’”
            Ao final da história, as crianças sorriram.
            Saíram para fora da tenda de Benjamin e começaram a brincar. Com o arco-íris nos céus pode-se brincar sobre a terra sem medo...


Rubem Alves. Perguntaram-me se acredito em Deus. Capítulo VII. A arca de Noé.


De vez em quando  é bom lembrarmos das velhas estórias, que sempre serão novas também. Pra que a gente não esqueça do amor de Deus, das suas promessas e do valor que temos. Do valor que devemos dar à vida, ao nosso planeta, aos nossos amigos, à nossa família. Do valor que devemos dar à Deus, que nos ama incondicionalmente.
Essas estórias, não são tão simples como parecem. Crescemos ouvindo elas e não damos a importância que merecem.... Deus ainda nos ensina com elas..



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