A
tempestade tinha assustado a todos. Chuvas eram raras e quando vinham eram
mansas. Mas naquele dia as águas caíram pesadas. As crianças ficaram com medo.
Começaram a imaginar uma chuva que não teria fim, uma chuva que caísse sempre,
que enchesse os vales e cobrisse tendas e árvores, uma chuva que trouxesse a
morte para homens e animais. Foram à tenda de Benjamin e lhe contaram seus
medos. E ficaram a olhar dentro dos seus olhos, já enrugados nos cantos pela
idade, a longa cabeleira branca caindo sobre os seus ombros. E foi esta a
estória que ele lhes contou:
“Aconteceu, sim, faz muitos e muitos
anos. Deus estava triste, muito triste com a maldade dos homens. Ao criar o
mundo ele imaginara que os homens seriam felizes tantas eram as coisas bonitas
que havia. O mundo era um jardim cheio de árvores, frutos, riachos, bichos
amigos. Sendo felizes teriam de ser bons. Mas eles não ficaram bons. Ficaram
maus. E, por causa da sua maldade – de onde ela teria vindo? – , a terra foi
ficando feia e cobrindo-se de tristeza. Deus penso então em começar tudo de
novo. Lavar o mundo da sua maldade, da mesma forma como se lava a roupa suja da
sua sujeira. Tomou então a decisão de lavar o mundo com água. Chuva, muita
chuva, chuva de dia, chuva de noite, chuva que encheria a terra e afogaria todo
o mal.
Mas havia um homem que havia
permanecido bom, ele e sua família. Seu nome era Noé. Noé, agricultor,
plantador de uvas, fabricante de vinhos... Deus então o fez sonhar. Pois é
assim que Deus se comunica com os homens, fazendo-os sonhar. E ele sonhou com
um dilúvio que cobria o mundo, o mundo inteiro transformado num mar sem fim e,
flutuando no mar, um navio. Olhando mais de perto o navio, ele viu quem estava
nele: ele mesmo e a sua família.
Noé acordou assustado e contou o
sonho para os seus filhos. ‘É uma revelação de Deus’, eles disseram.
‘Precisamos construir um navio para não morrer’. Ato contínuo, buscaram
madeiras, tomaram ferramentas, serrotes, martelos, pregos e puseram-se a
construir um navio que se chamava arca. Os vizinhos riam deles, achando que
haviam endoidecido. Mas eles não ligaram. Continuaram o seu trabalho. Até que o
navio ficou pronto. O céu já estava negro, coberto com nuvens sinistras. Os
primeiros pingos começaram a cair. Noé
ordenou que sua família entrasse no navio.
E os animaizinhos? Os animaizinhos
não eram malvados, não mereciam morrer, disse um menino.
“Não”, disse Benjamin com um
sorriso. “ O navio era grande para todos eles. Assim, Noé ajuntou todos os
animais seus amigos, ovelhas, cabritos, bodes, jumentos, cães, gatos,
carneiros, bois, vacas, cavalos, galos, galinhas, patos, gansos, pombas,
corvos...”
“ E os coelhinhos?”, perguntou uma
menina que tinha um coelhinho branco no colo.
“Também os coelhinhos. Os peixes
não, porque eles sabem nadar. Entraram todos no navio e Noé fechou a porta. E
veio a chuva. Choveu durante quarenta dias e quarenta noites. Depois de
quarenta dias parou de chover. As águas baixaram e as plantas ficaram verdes de
novo. Mas Noé estava fechado dentro do navio. Não sabia o que estava
acontecendo do lado de fora. Aí ele teve uma ideia: pegou um corvo e disse-lhe
que voasse sobre a terra e lhe trouxesse informações sobre como estava o mundo.
O corvo saiu, viu aquela beleza toda e se esqueceu de voltar para contar. Noé
então mandou uma pombinha. A pomba foi, viu e voltou com um ramo de oliveira no
bico. Noé compreendeu. O ramo de oliveira estava dizendo: ‘Está tudo em paz’.
Desde então, as pombas passaram a ser o símbolo da paz”.
“Mas, e se Deus resolver mandar
outro dilúvio?”, perguntou um menino.
Benjamin tomou as crianças e as
levou para fora de sua tenda. Havia um enorme arco íris no céu.
“Estão vendo o arco-íris com sete
cores? Quando o dilúvio acabou, Deus pensou: ‘Agora os homens ao ficar com medo
de outro dilúvio. Preciso dizer a eles que nunca mais um dilúvio destruirá a
terra. Darei ordens ao Sol para que ele faça passar sua luz pela água da chuva,
e faça um vitral de cores no céu. Sete cores. Esse vitral de sete cores, o
arco-íris, será a minha assinatura nos céus, como garantia da minha
promessa...’”
Ao final da história, as crianças
sorriram.
Saíram para fora da tenda de
Benjamin e começaram a brincar. Com o arco-íris nos céus pode-se brincar sobre
a terra sem medo...
Rubem Alves. Perguntaram-me se acredito em Deus. Capítulo
VII. A arca de Noé.
De vez em quando é bom lembrarmos das
velhas estórias, que sempre serão novas também. Pra que a gente não esqueça do
amor de Deus, das suas promessas e do valor que temos. Do valor que devemos dar
à vida, ao nosso planeta, aos nossos amigos, à nossa família. Do valor que
devemos dar à Deus, que nos ama incondicionalmente.
Essas estórias, não são tão simples como parecem.
Crescemos ouvindo elas e não damos a importância que merecem.... Deus ainda nos
ensina com elas..