sábado, 31 de março de 2012

CÉUS









CÉUS

Quero informar os meus leitores daquilo que sinto e penso acerca da vida após a morte. Meu coração está tranquilo e não há dúvidas que o perturbem porque são duas, apenas duas, as possibilidades à minha frente:
Primeira possibilidade: há vida após a morte. Nesse caso, estou tranquilo, porque se há vida após a morte, é porque há um Poder Misterioso que garante, poder esse a que alguns dão o nome de Deus, sem saber o que ele seja. No caso de haver esse Poder Misterioso, é minha tola convicção (todas as convicções são tolas) de que ele é só amor. Não estou sozinho nessa crença, tendo a meu favor o testemunho de profetas, místicos e poetas, sendo só amor, é claro que a vida após a mote será uma realização do amor. A ideia de que o Poder  Misterioso é um torturador que mantém, para prazer próprio, uma câmara de torturas sem fim chamada inferno é uma calúnia espalhada pelos seus inimigos, na esperança de que os homens deixem de amá-lo e passe a odiá-lo. Mas quando é que o amor se realiza? O amor se realiza quando recebemos de volta as coisas que amamos e perdemos. É por isso que sentimos saudade. A saudade é a nossa alma dizendo para onde ela quer voltar. Assim, havendo uma vida após a morte, estou certo de que voltarei a subir em jabuticabeiras, a brincar em riachinhos, a balançar no balanço amarrado no galho de mangueira, a comer ora-pro-nobis refogado  com carne de porco, angu, feijão e pimenta, a fazer virar a locomotiva Maria-fumaça no virador, a empinar papagaios em tardes de céu azul, a catar flores de paineira para com elas fazer soldadinhos... Que mais posso desejar? Como disse a Maria Alice, deve haver tantos céus quantas pessoas há. Meu céu não é igual ao seu. Nem poderia ser. Nossas saudades são diferentes. Em toro de cada pessoa gira um universo que é só dela. Dizem os astrônomos que há muitos bilhões de anos ( para mim não faz a menor diferença se são bilhões ou milhões, porque esses números são impensáveis) houve um estouro gigantesco, o Big-Bang, a partir do qual foram projetados no espaço sem fim os astros celestes que hoje formam o universo que conhecemos. Nada impede que haja infinitos outros, além dos nossos telescópios. Pois eu acho que não foi só isso: todos nós fomos também projetados no espaço sem-fim, cada um de nós é uma estrela em volta da qual se forma uma nebulosa espiralada... Essa é a primeira e deliciosa possibilidade.
Segunda possibilidade: não há vida após a morte. Nesse caso, a morte significa que vou voltar ao lugar onde estive por todo o tempo infinito passado, inclusive no Big-Bang. Esse período de bilhões de anos não me foi doloroso, não me fez sofrer, nem demorou a passar. E poderei, então, imaginar que o evento maravilhoso do meu nascimento a partir desse caos indefinido poderá se repetir daqui a um bilhão de anos, mas não sofrerei nem ficarei impaciente, porque estarei mergulhado no sono profundo da não-existencia. Assim, por que ter medo? Medo eu não tenho. Tenho é tristeza, porque este mundo é muito bom e quereria continuar a fazer minhas coisas por aqui. Pelo menos por agora é isso que sinto. Pode ser que eu venha a mudar de ideia. Fernando Pessoa escreveu um poema que diz assim:

Tenho dó das estrelas,
Luzindo há tanto tempo,
Há tanto tempo...
Tenho dó delas.
Não haverá um cansaço
Das coisas,
De todas as coisas,
Como das pernas ou de um braço?
Um cansaço de existir,
De ser,
Só de ser,
O ser triste brilhar, ou sorrir...
Não haverá,enfim,
Para as coisas que são,
Não a morte, mas sim
Uma espécie de fim,
Ou uma grande razão –
Qualquer coisa assim
Como um perdão?


Pode ser que eu venha a sentir esse cansaço e venha a desejar um fim. Mas ainda não me sinto cansado...


TEXTO RETIRADO DO LIVRO: PENSAMENTOS QUE PENSO QUANDO NÃO ESTOU PENSANDO. DE RUBEM ALVES.

quinta-feira, 29 de março de 2012

O balde


O balde


Quando menino, eu era muito inconstante e preguiçoso.
Faltava-me persistência, inclusive para os estudos.
Um dia, quando eu brincava no quintal, meu avô chamou-me e mostrou-me, no soalho do galpão, um grande balde cheio de agua.
Tinha na mão uma linda pera, lisa e brilhante que , de imediato despertou a minha cobiça. Entretanto, para minha decepção, ele não me deu. Pegou o fruto, delicioso e maduro, e colocou-o na agua, onde ele ficou a flutuar. E, então, me disse:
 - você quer essa pera, não quer? Pois ela será sua. Mas você terá de apanha-la, sem o auxilio das mãos, só com os dentes. A pera era tentadora e eu atirei-me à tarefa que, de início, até me pareceu divertida.
Entretanto, aos poucos, fui me cansando e terminei por desistir, sem lograr o objetivo.
Meu avô, porém, incitava-me a tentar de novo, a redobrar esforços.
E, ao cabo de algum tempo – eu já estava com as costas  doendo e alagado de suor - , consegui abocanhar a fruta.
E foi com orgulho que a entreguei ao meu avô.
Então ele me disse com simplicidade, sorrindo bondosamente:
 - você viu coo é agradável a sensação que teve ao vencer? Se quiser ter para si os frutos bons da vida e sentir sempre essa maravilhosa emoção que o faz sorrir, lembre-se disto: é preciso persistir, persistir e persistir. Tome, a pera é sua, você vê que, agora, tem mesmo direito a ela.
A lição impressionou-me profundamente.
E hoje, toda vez que me sinto inclinado ao desânimo, lembro-me daquela experiência com a pera e atiro-me para frente, com redobrados esforços.

Ampara teu filho ainda hoje, conduzindo-o nas veredas do bem, a fim de que não lhes chores a perda, amanha, nas constantes arremetidas do mal.
Bezerra de Menezes

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: E, PARA O RESTO DA VIDA.... DE WALLACE RODRIGUES

quarta-feira, 28 de março de 2012

O boneco


O boneco



Um dia vovó comentou que os doces – feitos por ela e minha mae naquela manhã – haviam desaparecido do armário. E não sabia o que tinha sido feito deles
Embora nenhuma das duas  parecesse de qualquer forma preocupada com a ocorrência, eu imediatamente disse:
. – Foram roubados.
Elas me olharam surpreendidas, mas foi vovó quem estabeleceu conversação comigo.
. – você tem certeza?
. – Tenho! Sustentei. E foi o Pedrinho. Pedrinho era um dos meus irmãos. Vovó insistiu:
. – Voce tem certeza?
. – Se tenho! Foi o Carlucho quem me contou.
. – Minha filha, disse ela tranquila, passando o braço pelo meu, venha até o eu quarto. Quero lhe mostrar uma coisa.
No quarto ela abriu a gaveta da cômoda e tirou, lá de dentro, um boneco que eu nunca tinha visto.
. – Veja coo está bem vestido!
Eu  não estava entendendo. Aquilo nada tinha a ver com o caso dos doces. Ela prosseguiu:
. – Vá dizendo o que mais lhe chama a  atenção neste boneco.
. – Tem uma bonita roupa, uma camisa linda! Respondi ao observar os punhos, o peitilho e o colarinho impecáveis.
Assim que terminei de falar, minha avó tirou o paletó do boneco. Caí na gargalhada quando vi que da impecável camisa só havia os punhos, o peitilho e  o colarinho.
Mas, de súbito, compreendendo, me tornei muito séria.
E vovó, abraçando-me a sorrir, disse concluindo:
. – Veja você como são as coisas. A gente só pode crer naquilo que vê. E do que se vê, muitas vezes é preciso acreditar apenas na metade. Você percebeu por que?
Já se passaram muitos anos. Mas, sempre que sou levada, por certa irreflexão – tao comum nos seres humanos  - a julgar fatos ou pessoas pelas aparências, vem-me à lembrança a impecável camisa daquele boneco da vovó...

Se desejas teu caminho
Repleto de paz e luz,
Traze o amor de teu filhinho
Ao santo amor de Jesus.
(Joao de Deus)

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: E, PARA O RESTO DA VIDA... DE WALLACE RODRIGUES

terça-feira, 27 de março de 2012

A carroça




A carroça

Uma das grandes preocupações de nosso pai, quando éramos pequenos, consistia em fazer-nos compreender o quanto a cortesia é importante na vida.
Por varias vezes percebi o quanto lhe desagradava o hábito que tem certas pessoas de interromper a conversa quando alguém estava falando. Eu, especialmente, incidia muitas vezes nesse erro. Embora visivelmente aborrecido, ele, entretanto, nunca ralhou comigo por causa disso, o que me surpreendia bastante.
Certa manhã, bem cedo, ele me convidou para ir ao bosque a fim de ouvir o cantar dos pássaros. Acendi com grande alegria e lá fomos nós, umedecendo nossos calçados com o orvalho da relva.
Ele se deteve em uma clareira e, depois de um pequeno silêncio, me perguntou:
- você está ouvindo alguma coisa além do canto dos pássaros?
Apurei o ouvido alguns segundos e respondi:
Estou ouvindo o barulho de uma carroça que deve estar descendo pela estrada.
- isso mesmo... disse ele. É uma carroça vazia...
De onde estávamos não era possível ver a estrada e eu perguntei admirado:
 - Como pode o senhor saber que está vazia?
 - Ora, é muito fácil saber que é uma carroça vazia. Sabe por que?
 - Não! Respondi intrigado.
Meu pai pôs-me a mão no ombro e olhou bem no fundo dos meus olhos, explicando:
- Por causa do barulho que faz. Quanto mais vazia a carroça, maior é o barulho que faz.
Não disse mais nada, porém deu-me muito em que pensar.
Tornei-me adulto e, ainda hoje, quando vejo uma pessoa tagarela e importuna, interrompendo intempestivamente a conversa de todo o mundo ou quando eu  mesmo, por distração, vejo-me prestes a fazer o mesmo, imediatamente tenho a impressão de estar ouvindo a voz de meu pai soando na clareira do bosque e me ensinando:
 - Quanto mais vazia a carroça, maior é o barulho que faz!

No universo de teu lar
Não te esqueças do povir;
Criança por educar
É mundo por construir

 (Joao de Deus)

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: ...E PARA O RESTO DA VIDA, DE WALLACE LEAL V. RODRIGUES

domingo, 25 de março de 2012

Mulheres que pioram seus homens


As leis fundamentais de uma relação saudável – PARTE I

Mulheres que pioram seus homens

Há mulheres que reclamam do seu parceiro, mas tudo o que fazem só faz piorar as coisas. São especialistas em rezar sermões para que eles se convertam da sua estupidez para a lucidez, do seu radicalismo para o terreno da afetividade. A melhor maneira de descomplicar a mente do homem é, primeiramente, simplificar a mente da mulher.
Ela libertar-se dos seus maneirismos, da sua impulsividade e desenvolver uma mente autônoma, livre, relaxada, capaz de impactá-los com elogios. Elogiar pequenos gestos de um homem radical sulcará seu árido solo emocional.
Mulheres inteligentes não apontam as “loucuras” dos seus homens, mas elogiam as atitudes lúcidas que possuem, ainda que tímidas: “Parabens pela sua inteligente resposta”, “você foi admirável”. Não denunciam sua insensibilidade, mas exaltam as atitudes afetivas, ainda que frágeis e raras: “você me surpreendeu”, “sua generosidade me encantou”. Se você fizer uma pauta diária, um novo texto poderá ser escrito.
Oriento os pais, educadores e outros profissionais que assistem as crianças autistas – que vivem alienadas em seu mundo – a teatralizar os gestos com solenes elogios, usando palmas, sorrisos e palavras eloquentes, mesmo que elas não compreendam a natureza das palavras, começam a construir janelas light que iniciam pontes sociais ao longo das semanas e meses. A partir dessas pontes, pouco a pouco podem-se desenvolver funções complexas da inteligência, como pensar nas consequências do comportamento e se colocar no lugar do outro.
A técnica da teatralização da emoção objetiva tanto desenvolver como retirar o Eu do seu cárcere ou claustro, promovendo o prazer da troca. Tal procedimento não é uma mensagem de autoajuda, não pode ser praticado de vez em quando, é uma técnica psicoterapêutica e educacional poderosíssima que deve ser vivenciada todos os dias durante a vida.
Teatralizar, de maneira mais branda, que também se está decepcionado triste ou de alguma forma sentido com o comportamento de um filho, ainda que seja uma criança autista, pode também complementar essa técnica. Jamais se deveria agredir, bater ou gritar, pois, além de ser inumano, é antieducacional, produzem-se janelas killer e o encarceramento do eu.
Elogie os lampejos altruístas dos seus filhos e alunos, valorize suas diminutas atitudes humanistas, aplauda qualquer atitude que promova o dialogo e não a agressividade. É possível que você assista ao nascimento da generosidade em terrenos inóspitos da insensibilidade. Uma professora que conheça a Teoria das janelas da Memória pode revolucionar o microscmo da sua sala de aula.
Há intelectuais toscos, grosseiros, travados. Jamais elogiariam seus íntimos, seus pares e seus alunos. Desconhecem o alfabeto da emoção e não sabem que o poder do elogio aproxima mundos, cruza historias, diminui intrigas, alivia traumas, constrói pontes, aplaina relações difíceis.
Uma pessoa madura é capaz de não apenas elogiar quem ama, mas todas as pessoas que de alguma forma o servem. Quem não é capaz de elogiar porteiros, garçons, cozinheiros, faxineiros, não é digno de ser servido por eles. Como abordo no livro O Vendedor de sonhos, há pessoas tão pobres que só têm dinheiro. Há pessoas tao incultas que só têm cultura acadêmica.

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: MULHERES INTELIGENTES, RELAÇÕES SAUDÁVEIS. DE AUGUSTO CURY

sexta-feira, 23 de março de 2012

TUAS INSATISFAÇÕES


TUAS INSATISFAÇÕES

“um dos defeitos da Humanidade é ver o mal de outrem antes de ver o que está em nós...”
“... Incontestavelmente, é o orgulho que leva o homem a dissimular os próprios defeitos, tanto morais como físicos...” (CAP. X, item 10)

Jovens, adultos, idosos, criaturas das varias posições sociais e dos mais diferentes contextos de vida, sofrem a aguilhoada da insatisfação.
Muitos solteiros procuram incessantemente parceiros afetivos para que as “sarças da solidão” não possam alfinetar suas necessidades intimas de se completarem no amor, esquecendo-se, porém, de que solidão é a falta de confiança em nós mesmos, quando nos rejeitamos e nos desprezamos, e não a falta de alguém em nossas vidas.
Diversos casados reclamam sistematicamente que já não vêem mais o cônjuge com os mesmos olhos de antes e, por isso, sentem-se desiludidos e abalados frete a união infeliz, que outrora julgavam acertada. Contudo, não observaram que a decepção não era com o outro, porem com eles próprios. Por não aceitarem seus fracassos, e que projetam suas incompetências e insatisfações como sendo “pelos outros” e nunca “por si mesmos”.
Varias criaturas enfrentam a pobreza, lutam incansavelmente para a aquisição de recursos amoedados, tentando desta forma sair das agruras da miséria. Não percebem, todavia, que prosperidade é uma atitude de espirito, e que quanto mais declaram à sua mente que estão abertos para aceitar a abundancia do Universo, mais a consciência se torna próspera; que a verdadeira prosperidade não se expressa em quantia de bens que possuem, mas sim, no receber e no dividir todo esse imenso tesouro de possibilidades herdado pela nossa Criação Divina.
Multiplos ricos labutam constantemente para acumular mais e mais, e afirmam que isso é necessário para assegurar a manutenção dos bens já amontoados, por previdência e cautela. Não se dão conta de que sua insatisfação é produto da ganância desmedida, por alimentarem crenças de escassez e míngua e por acreditarem que a riqueza é que nos fazem homens respeitados e consideráveis, pois ainda não tomaram consciência do que é “ser” e do que é “ter”.
Outros tantos buscam o poder, como forma de encobrirem o desgosto e de se auto afirmarem frente ao mundo, escravizando em plena atualidade criaturas simples e incautas, para satisfazerem o seu “ego neurótico”. O desânimo tomou tamanha amplidão em torno deles,  que, acreditam que, mandando arbitrariamente e desrespeitando leis e limites dos outros, possam eliminar o desalento que os ameaça constantemente.
Jovens e adultos buscam dissimular a insatisfação interior, e para isso adquirem títulos acadêmicos, acreditando que a outorga dessa distinção possa trazer-lhes permissão, diante da sociedade, para dominar e sobressair, com prestígio e capacidade que pensam possuir, quando, em verdade, não descobriram que o verdadeiro prestigio e capacidade se tornam possíveis a partir do momento que investimos em nossos valores mais íntimos, em busca do autodomínio.
Insatisfação não se cura projetando-a a situações, a pessoas, a títulos, a poder,  a posições sociais, mas reconhecendo a fonte que a produz.
Jesus de Nazaré, o Sublime Preceptor das Almas, convoca-nos a distinguir as verdadeiras traves que não nos deixam avistar as “causas reais” de nossas insatisfações e nos receita o remédio ideal: fazermos autodescobrimento para realmente descortinar de nossas profundidade as matrizes de nossos comportamentos inadequados, que fazem emergir de nós mesmos essa incômoda atmosfera de “descontentamento” a envolver-nos de tempos em tempos.

Francisco do Espírito Santo Neto – Renovando Atitudes, espírito Hammed

quinta-feira, 22 de março de 2012

GRANDES ROMANCES PODEM MORRER SEM O PODER DO ELOGIO


As leis fundamentais de uma relação saudável – PARTE I

O PODER DO ELOGIO E OS INVESTIMENTOS EM SONHOS

GRANDES ROMANCES PODEM MORRER SEM O PODER DO ELOGIO

Grandes romances terminam em crises porque os amantes, ao invés de temperarem a relação com elogios, temperam com atritos, críticas, reações estupidas.  Diante de um sacerdote, milhões de casais prometem que na saúde e na doença, no sucesso e no fracasso, na riqueza e na pobreza se amarão. Prometem e não cumprem, pois não sabem que a emoção não recebe ordens do Eu, esse Eu apenas a gerencia e protege.
O sacerdote deveria conhecer a Teoria das Janelas da Memória e do Eu como autor da história para dar uma breve conferência para esses casais sobre os erros capitais das relações doentes e as leis fundamentais das relações saudáveis antes de eles fazerem juras de amor. Caso contrário o altar se torna uma doce ilusão. Seus romances começam a ir ladeira abaixo.
O sexo saudável, prazeroso, regado a entrega e afetos é muito importante. Mas sexo por si só não segura um casal. Passear, viajar, tirar férias juntos é bom. Mas o turismo não segura uma relação. Comprar joias, presentes casas, apartamentos, casa de praia, carros, pode ser agradável no entanto, o dinheiro não é suficiente para segurar uma relação, a não ser por conveniência. Todos esses elementos são importantes, mas o fundamental é presentear quem amamos com frequentes elogios, abraços, com um ombro amigo, diálogos serenos. Uma casa simples pode ser muito agradável, dependendo do seu conteúdo, pelo idêntico motivo um palácio pode ser frio e solitário.
Elogiar cada gesto, um abraço, uma palavra amiga, o sabor da comida, é fundamental. A presença dos elogios relaxa, realça o sabor do sexo, das flores, dos presentes, dos passeios. A sua ausência estressa, contrai o sabor da vida. Um amante se torna admirável não quando dá o mundo de fora para a sua amada, mas quando dá seu próprio mundo para ela e vice-versa.
Por que as dores, perdas, traições, frustrações, se tornam inesquecíveis? Por que o fenômeno RAM arquiva de maneira privilegiada tudo o que tem carga emocional, criando janelas Killer power. Você esqueceu milhões de experiências emocionalmente fracas, mas não as que imprimiram dor. Casais inteligentes deveriam usar o fenômeno RAM positivamente. Devem ter plena consciência que esse surpreendente fenômeno arma surpresas, arquiva palavras motivadoras e registra privilegiadamente notáveis elogios.

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: MULHERES INTELIGENTES, RELAÇÕES SAUDÁVEIS. DE AUGUSTO CURY


quarta-feira, 21 de março de 2012

As leis fundamentais de uma relação saudável


Para Homens Inteligentes

Ninguém é digno de construir um grade romance se não aprender a elogiar uma mulher. Os elogios nutrem a emoção, fomentam a coragem, inspiram a motivação. O poder do elogio pode ser mais forte que o das armas, mais poderoso que o dinheiro, mais penetrante que a lâmina de um bisturi. Homens inteligentes fazem pelo menos um elogio por dia para a mulher que ama e para seus filhos.
Um homem inteligente não gravita na própria órbita, não vive nas raias do individualismo, sabe promover uma mulher, incentiva sua caminhada, investe em seus sonhos, aplaude seu sucesso. Sabe que, ao lado ou na frende de um grande homem, há sempre uma mulher brilhante e realizada.


As leis fundamentais de uma relação saudável – PARTE I

O poder do elogio e os investimentos em sonhos

Muitos vivem de migalhas de elogios

De todas as leis fundamentais das relações saudáveis, o elogio é a mais acessível e a mais fácil de praticar, embora poucos seres humanos pratiquem. O poder do elogio pode ser mais forte que o das armas, mais poderoso que o dinheiro, mais penetrante que a lâmina de um bisturi. Os elogios desfizeram inimigos, debelaram ódios, evitaram suicídios, reataram relações.
Uma mulher inteligente deve economizar críticas, mas jamais deveria economizar elogios. A crítica excessiva contrai a espontaneidade, e o elogio realça a autoconfiança. Contudo, é incrível como pais, professores, executivos e casais economizam elogios e têm pouca habilidade para elogiar. Somos ótimos para exaltar  erros, mas não para exaltar acertos. Se conhecessem a Teoria das Janelas da Memória e a formação de janelas light jamais viveriam de migalhas de elogios.
Os elogios deveriam entrar no cardápio diário de suas existências. Entram no seu cardápio? Quem você elogiou hoje? E como elogiou? Mesmo pessoas afetivas podem ser miseráveis em elogiar.
Elogiar não é superproteger. Superproteger é colocar os outros numa estufa, é controlar os elementos agressores, é exigir nada. Elogiar é encorajar a caminhada, é propiciar força nas intempéries, coragem nos tropeços e credito na superação.
Pais que elogiam tornam-se plantadores de janelas light que alicerçam o Eu como ator principal. É provável que 90% deles não tenham uma prática diária de nutrir o psiquismo dos filhos com elogios. Infelizmente, a maioria segue a lei do menor esforço, dão roupas, suprem o corpo, presenteiam com computadores e celulares, mas não nutrem o psiquismo deles com inteligência.
“Obrigado, filho por existir!”, “Parabéns, você foi brilhante!”, “Você foi derrotado, mas não tem problema, o importante é que tentou. Estou orgulhoso de você!”, “Vá em frente, você consegue!”, são pequenas frases que penetram nos recônditos da mente de quem amamos e nos toram inesquecíveis. Você é um educador inesquecível ou cumpre penas papeis burocráticos da educação? Pais que não sabem elogiar não ensinam a seus filhos a arte de agradecer! Não reclame deles, revise sua postura! 

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: MULHERES INTELIGENTES, RELAÇÕES SAUDÁVEIS.  DE AUGUSTO CURY

quarta-feira, 14 de março de 2012

Era preciso que nos tornássemos crianças...




"Minha infância foi uma infância feliz. Vivi anos de pobreza. Mas não tenho desses anos nem uma memória triste. As crianças ficam felizes com pouca coisa. Não era preciso dizer os nomes dos deuses... nem eu os sabia. O sagrado aparecia, sem nome, no capim,  nos pássaros, nos riachos, na chuva, nas árvores, nas nuvens, nos animais. Isso me dava alegria! Como no paraíso... No paraíso não havia templos. Deus andava pelo jardim, extasiado, dizendo: "Como é belo! Como é belo!" A beleza é a face visível de Deus. Menino, o mundo me era divino e sem deuses. Talvez seja essa a razão por que Jesus disse que era preciso que nos tornássemos crianças de novo, para ver o paraíso espalhado pela terra.".

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: SE EU PUDESSE VIVER MINHA VIDA NOVAMENTE.
RUBEM ALVES.


"Fé é um morango que se come pendurado num galho à beira do abismo, pelo gosto bom que tem, sem nenhuma promessa de que ele nos fará flutuar quando o galho quebrar..."
Rubem Alves

domingo, 11 de março de 2012

Chapeuzinho Vermelho



Chapeuzinho Vermelho

Era uma vez uma jovem adolescente a quem todos conheciam pelo apelido de Rúbia. Rúbia é uma palavra derivada do latim, rubeus, que quer dizer vermelho, ruivo. Rúbia era ruiva. Ruiva porque tingira seu cabelo castanho que ela considerava vulgar. Ela pensava que uma ruiva teria mais chances de chamar a atenção de um empresário de modelos que uma morena. Morenas há muitas. O vermelho de seus cabelos era confirmado pelo seu temperamento: ela era fogo e enrubescia quando ficava brava. [Nota: se, nesta estória, eu lhe desse o nome de Chapeuzinho Vermelho, ninguém acreditaria. As adolescentes de hoje não andam por aí usando chapeuzinhos vermelhos...]
Rúbia morava com sua mãe numa linda mansão no Condomínio Omegaville. Pois, numa noite, por volta das 10 horas, sua mãe lhe disse: “Rubinha querida, quero que você me faça um favor...”.  Rúbia pensou: “Lá vem a mãe de novo...”. E gritou: “De jeito nenhum. Estou vendo televisão...”. “Mas eu ia até deixar você dirigir meu BMW...”, disse a mãe. Rúbia se levantou de  um pulo. Para guiar o BMW ela era capaz de fazer qualquer coisa. “Que é que você quer que eu faça, mamãezinha querida?”, ela disse. “Quero que você vá levar uma cesta básica para sua vovozinha, lá na Rocinha”. Você sabe: andar de BMW, depois das 10 da noite, na Rocinha é perigoso. Os sequestradores estão à espreita...
Rúbia já estava sando da garagem com o BMW quando sua mãe lhe gritou: “A cesta básica! Você está se esquecendo da  cesta básica!”. Com a cesta básica no BMW, Rúbia foi para a casa da vovozinha, na Rocinha. Foi quando o inesperado aconteceu. Um pneu furou. Até mesmo pneus de BMWs furam. Rúbia se sentiu perdida. Com medo, não. Ela não tinha medo. O problema era sujar as mãos para trocar o pneu. Foi quando um Mercedes se aproximou, dirigido por um senhor elegante que usava óculos escuros. Há pessoas que usam óculos escuros mesmo de noite. O Mercedes parou e o homem de óculos escuros saiu. “Precisando de ajuda, boneca?”, ele perguntou. “Claro”, ela respondeu. “Preciso que me ajudem a trocar o pneu furado”. “Pois vou ajudar você”, disse o homem. “Você precisa de proteção. Este lugar é muito perigoso. A propósito, deixe que me apresente. Meu nome é Crescêncio Lobo, as suas ordens”. Aí ele se pôs a trocar o pneu, cantarolando baixinho uma canção que sua mãe lhe cantara: “Hoje estou contente, vai haver festança, tenho um bom petisco para encher a minha pança...”.
Rúbia, olhando para Crescêncio Lobo, pensou: “Que homem gentil e prestativo! E ainda canta enquanto trabalha.. . É dono de um Mercedes! Acho que minhas orações foram atendidas!”. “Pronto”, ele disse. “Para onde você está indo, boneca?”. “Vou levar uma cesta básica para minha avó”. “Pois eu vou segui-la para protegê-la...”. E assim, Rúbia, sorridente e sonhadora, se dirigiu para a casa da sua avó, escoltada por Crescêncio Lobo.
Ao chegar à casa da avó, Crescêncio Lobo se surpreendeu. Pensou que ia encontrar uma velhinha, parecida com a avó de Chapeuzinho vermelho. Que nada! Era uma linda mulher, uma senhora elegante, fina, de voz suave, inteligente. Logo os dois estavam envolvidos numa animada conversa: Crescêncio Lobo encantado com o suave charme e a inteligência da avó, a avó encantada com o encantamento que Crescêncio Lobo sentia por ela. Crescêncio Lobo pensou: “Se não fossem essas rugas, ela seria uma linda mulher...”. Rúbia percebeu o que estava rolando, e foi ficando com raiva, vermelha, até que teve um ataque histérico. Como admitir que Crescêncio Lobo preferisse uma velha a uma adolescente? Começou a gritar e, por mais que os dois se esforçassem, não conseguiam acalmá-la. Passava por ali, acidentalmente, uma viatura do 5º Distrito Policial. Os policiais, ouvindo a gritaria, imaginaram que um crime estava acontecendo. Pararam a viatura e entraram na casa. E o que encontraram foi aquela cena ridícula: uma adolescente ruiva, desgrenhada gritando como louca, enquanto a avó e Crescêncio Lobo tentavam acalmá-la. Os policiais perceberam loggo que se tratava de uma emergência psiquiátrica e, com a maior delicadeza (os policias do 5º DP são sempre assim. Também, pudera... O delegado-chefe trabalha ouvindo música clássica!) convenceram Rúbia a acompanhá-los até um hospital para ser medicada. Rúbia não resistiu porque ela já estava encantada com a força e o charme do policial que a tomava pela Mao. Afinal, aquele policial era lindo e forte!
Quanto a avó e Crescêncio Lobo, aquela noite foi o início de uma relação amorosa maravilhosa. Crescêncio Lobo percebeu que não há cara de adolescente cabeça de vento que se compare ao estilo de uma senhora inteligente e experiente. E a avó, que ouvira uma feminista canadense que o melhor remédio para velhice são os galetos ao primo canto, entregou-se gulosamente a esse hábito gaucho.  Crescêncio Lobo pagou-lhe uma plástica geral e a avó ficou novinha. E viveram muito felizes, por muitos anos. Quanto a Rúbia, aquela crise foi o início de uma feliz relação com o policial do 5º DP, que tinha mestrado em psicologia da adolescência...

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: QUER QUE LHE CONTE UMA ESTÓRIA? RUBEM ALVES

sábado, 10 de março de 2012

Dor-de-idéia



Dor-de-idéia

Você está com do de dente. O dentista examina o dente e lhe diz que não tem jeito. A solução é arrancar o dente. Anestesia e boticão, o dente é arrancado. A dor desaparece. Você deixa de sofrer. Esse é um paradigma de como são resolvidos os problemas que têm a ver com cojisas concretas: a lâmpada que queimou, o ralo que entupiu, a unha que encravou, o motor que fundiu, a perna que quebrou: são as dores-de-coisaas. Dores-de-coisas se resolvem tecnicamente, cientificamente. A coisa fica diferente quando a dor que você tem é uma dor-de-idéia. Dor-de-idéia dói muito. São dores-de-idéia a ideia de perder o emprego, a ideia de ser feio, a ideia de ser burro, a ideia de que o filho vai morrer num desastre, a ideia de que Deus vai mandá-lo para o inferno, a ideia de que quem você ama vai traí-lo. Dores-de-idéia são terríveis: causam ansiedade, pânico, insônia, diarreia.
Virou moda falar em realidade virtual, com coisa inventada por computadores e eletrônica. Mas ela é velhíssima. Apareceu com o primeiro pensamento. Ideias são realidades virtuais. Realidade virtual é uma coisa que parece ser mas não é. Se parece ser mas não é deve ser inofensiva. Errado. As realidades virtuais produzem dor-de-idéia.
Quando a gente tem uma ideia, sabe que é só ideia, sem substância física, e a desepito disso ela nos causa dor-de-idéia, dizemos que é neurose. O neurótico sabe que o dragão que corre atrás dele é de mentirinha, não existe. Não obstante, essa mentirinha faz a adrenalina esguichar no sangue e o coração dispara.
Liguei a TV. Filme de ficção cientifica. Eu sabia que tudo era mentira. Aquelas coisas não existiam como realidade. Tinham sido produzidas num estúdio, diante de uma câmera. Mas eu comecei a sofrer de dor-de-idéia. Uma terrível ansiedade: “Meu Deus, o escorpião negro vai picar a moça”! “Burro! Burro”!, eu me dizia, num esforço de gozar o filme. “É tudo mentira! Ria! Relaxe!”. Inutilmente. Nós, os humanos, temos essa horrível e maravilhosa capacidade de sofrer pelo que não existe. Somos neuróticos.
Quando uma pessoa se sente perseguida pelo mesmo dragão que perseguiu o neurótico, adrenalina no sangue e coração disparado, mas além disso fica toda chamuscada pelo fogo que sai da boca do dragão, dizemos que ela é psicótica.o psicótico não separa o virtual do real. Para ele a ideia é coisa. Pensou, é real.
Porque as dores-de-idéia são tão ou mais dolorosas que as dores-de-coisas, os homens têm estado, desde sempre, procurando técnicas para acabar com elas.
As terapias para cura de dor-de-idéia podem se classificar em dois grupos distintos. No primeiro grupo estão as terapias baseadas na crença de que dor-de-idéia se cura com uma coisa que não é ideia. Chá de hortelã, refresco de maracujá, as variadas misturas preparadas pelo barman, um cigarrinho, maconha, pó branco, os florais de Bach, as poções e os pós sem-conta da farmacologia psiquiátrica, tranquilizantes, antidepressivos, estupidificantes, sonoterapia. Essas entidades não são ideias. São coisas. Coisas para curar ideias.
Os psiquiatras ficarão bravos comigo. Eles têm raiva dos Florais de Bach – que acusam de anticientíficos. Como posso eu colar os seus bioquímicos científicos junto aos Florais de Bach? As receitas são diferentes, os pressupostos são os mesmos: ideia se cura não com ideia, mas com coisa. O fato é que o sonho da psiquiatria é ter uma botica parecida com a botica dos Florais de Bach: líquidos diferentes, em vidrinhos diferentes, possivelmente com cores diferentes, para evitar equívocos, cada um para uma dor-de-idéia. Raiva: líquido verde. Apatia: líquido cizna. Depressão: líquido roxo. Complexo de inferioridade: líquido azul. Medo de impotência: líquido vermelho. Eu acho que as cores variadas podem até influenciar na cura.
O outro grupo acredita diferente: ideia se cura com ideia. Os remédios da psiquiatria são potentes. Eu mesmo já me vali deles, com excelentes resultados. O problema são os efeitos colaterais. É possível que, passado o efeito da droga, voltem as dores-de-idéia. Por vezes, para tirar a dor-de-idéia, a pessoa fica abobalhada. E se o resultado for maravilhoso, e a pessoa ficar totalmente feliz, ela ficará também totalmente idiota. As pessoas totalmente felizes não conseguem pensar pensamentos interessantes. É preciso ter um pouquinho de dor para que o pensamento pense bonito.
(O meu voo estava sendo tranquilo. Aí o telefone tocou. Uma voz: “Má noticia para lhe dar. Das Edições Loyola. O padre Galache morreu”. Uma imensa dor-de-idéia. Sim, porque ao meu redor tudo continua o mesmo. É uma ideia que me dói-dor-de-idéia que não é para ser curada. É para ser sofrida. Saber sofrer é parte da sabedoria de viver. O padre Galache era meu amigo. Editor dos meus livros. Plantarei uma árvore para ele).
Terapias para cura de dor-de-idéia. Rezas: repetição sonambúlica do terço tem o efeito terapêutico de entupir o pensador com palavras sem sentido. Quem reza sonambulicamente não pensa: se não pensa as dores-de-idéia não aparecem. Meditação transcedental. Cantar. Quem canta seus males espanta. Ah! Os maravilhosos efeitos terapêuticos dos “Corais de Bach” (note bem: “Corais” e não “florais”) que ouço para colocar em ordem a alma. Conversa tranquila. Confissão. Magia. Psicanálise, essa “conversa curante”: só se pode chegar às ideias por meio de ideias. Filosofia. Nem toda. Há uma filosofia que me torna pesado. Afundo. É a filosofia acadêmica que se faz profissionalmente. Todos os que estão escrevendo teses de filosofia sofrem de dores-de-idéia. A filosofia acadêmica pode emburrecer. Se houver ocasião, falaremos sobre o assunto. Mas há uma filosofia alegre, que me faz levitar. Quer levitar? Filosofe. Para fazer levitar a filosofia não pode nascer da cabeça. Ela tem de nascer das entranhas. Tem de ser escrita com o sangue. A gente lê e o corpo estremece: ri, espanta-se, tranquiliza-se, assombra-se. Muita filosofia, que no seu nascimento era cosia viva, sangrante, suco do pensador, nos cursos de filosofia se torna “disciplina”, grão duro, sem gosto, a ser moído. O aluno é obrigado a estudar para passar nos exames. Filosofia terapêutica há de ser feita com prazer. Kolakowski, filósofo polonês,  compara o filósofo a um bufão, bobo da corte, cujo ofício é fazer rir. O filosofar amansa as palavras: aquela cachorrada feroz que latia, ameaçava e na deixava dormir se transforma em cachorrada amiga de caudas abanantes. O filosofar ensina a surfar: de repente, a gente se vê deslizando sobre as ondas terríveis das dores-de-ideia. Também serve para por luz no escuro. Quando a luz se acende o medo se vai. Muita dor-de-idéia se deve à falta de luz. Os demônios fogem da luz. Wittgenstein diz que filosofia é contrafeitiço. É uma boa para nos livrar das dores-de-idéia, produtos de feitiçaria: há tantos feiticeiros e feiticeiras soltos por aí, tão bonitos: é só acreditar para ficar enfeitiçado... a filosofia nos torna desconfiados. Quem desconfia não fica enfeitiçado. Palavra de mineiro, pois fica, assim, um convite para brincar de filosofar...

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: O AMOR QUE ASCENDE A LUA. RUBEM ALVES

quarta-feira, 7 de março de 2012

O benefício da dúvida..


O benefício da dúvida...

Cliquei o botão do controle remoto da televisão e me vi dentro de um enorme templo, completamente lotado. O pregador dizia aos fiéis: “ A dúvida é a principal arma do diabo”. Ele não teve coragem de dizer tudo o que essa afirmação piedosa contém. Se ele está no púlpito, lugar sagrado, deve ser bispo ou missionário. Sendo bispo ou missionário, tem acesso privilegiado a Jesus: o Peixe Dourado lhe revelou pessoalmente os mistérios do mar... Fala diariamente com Jesus. Segue-se que aquilo que ele fala são as palavras de Jesus. Assim, se alguém tem dúvidas sobre o que ele diz, está duvidando de Jesus. Conclusão: quem duvida do que ele diz está enredado nas artimanhas do diabo... penso o contrário: que as convicções são as principais armas do diabo. As maiores atrocidades da história da humanidade, religiosas e políticas, foram cometidas por pessoas que não tinham dúvidas sobre a verdade dos seus pensamentos. As pessoas que duvidam, ao contrário, são tolerantes. Sabem que o que pensam não é a verdade. Seus pensamentos não passam de “palpites”. Por isso ouvem o que os outros têm a dizer, pois pode ser que a verdade esteja com eles...

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: PENSAMENTOS QUE PENSO QUANDO NÃO ESTOU PENSANDO... RUBEM ALVES

segunda-feira, 5 de março de 2012

SUSTO






Susto

Assustei-me: um homem, cabeleira branca, estava com os braços levantados, como se estivesse sendo assaltado, no aeroporto. Aproximei-me. De fato, era um velho. Devia ter aproximadamente a minha idade. De fato, estava com os braços levantados. Estavam apoiados no vidro que separa os que partem dos que ficam. Ele era um dos que ficavam. Lágrimas escorriam dos seus olhos. Alguém partira. Seus braços levantados, encostados no vidro, diziam da inutilidade das suas lágrimas. Há um momento na vida em que cada separação anuncia a Grande Separação. Olhei para o porteiro que verificava os cartões de embarque. Ele entendeu a pergunta que estava no meu olhar e disse: “O filho partiu...”. Tive vontade de abraçá-lo. Porque eu também tenho despedidas a cumprir.

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: PENSAMENTOS QUE PENSO QUANDO NÃO ESTOU PENSANDO. RUBEM ALVES


Grande verdade do Rubem Alves... eu já comecei a cumprir algumas despedidas.... faz parte da vida!

sábado, 3 de março de 2012

Albert Camus

GOSTARIA DE DAR OS PARABÉNS ADIANTADO A UMA QUERIDA AMIGA. QUE APARECEU DE REPENTE NA ESCOLA EM QUE EU DAVA AULA. CHEGOU PRONTA PRA CANTAR. MAS SE MOSTROU ENCANTADORA NA SUA FORÇA, NA SUA SABEDORIA E NA SUA AMIZADE. PORQUE NÃO SEI COMO ELA CISMOU EM APARECER EM UMA ÉPOCA EM QUE TUDO ESTAVA DESMORONANDO NA MINHA VIDA. E ME ENSINOU EM TÃO POUCO TEMPO O QUANTO VALE A PENA VIVER. SEMPRE. BRUNA, PARABÉNS PRA VOCÊ!!!!! ESCOLHI ESSE TEXTO DO RUBEM ALVES, PORQUE EU CONSEGUI TE ENXERGAR EM CADA FRASE. EXATAMENTE EM CADA FRASE. 











Albert Camus

                Amigos pediram-me para publicar textos dos escritores que mais amo. Vou atender ao pedido deles, mas quero pedir a vocês, leitores, que leiam devagar. É grosseria beber um licor fino de uma talagada só...

Vão aqui alguns textos de Albert Camus, anotações soltas que ele escreveu em cadernos, sem ordem, do jeito como apareciam. O escritor é um pintor de cenários. Enquanto lê, veja os cenários que ele pinta. Você poderá até imaginar as cenas que ele estava vendo quando escreveu. Frequentemente escrevemos para não deixar que as cenas nos fujam...

Céu de trovada em agosto. Aragem escaldante. Nuvens negras. No entanto, do lado do nascente uma faixa azul, delicada, transparente. Impossível fixa-la. A sua presença é uma tortura para os olhos e para a alma. Porque a beleza é insuportável. Ela desespera-nos, eternidade de um minuto que desejaríamos prolongar pelo tempo afora.

É a furiosa paixão de viver que dá sentido aos meus dias.

Se ainda me oprime alguma angústia, é por sentir este momento intangível escorregar entre os dedos como as perolas do mercúrio. Sou feliz neste mundo, pois o meu reino é deste mundo. Nuvem que passa e instante que se desvanece

Quando vemos pela primeira vez o resplendor da felicidade no rosto de um ser que amamos, sabemos que não pode haver outra vocação para um homem que não seja a de suscitar essa luz nos rostos que o rodeiam.

Segundo os chineses, os impérios que estão à beira da ruína têm numerosas leis.

Só tardiamente ganhamos coragem para assumir aquilo que já sabemos

Por uma psicologia generosa: ajudamos mais uma pessoa dando dela própria uma imagem favorável do que apontando constantemente seus defeitos.

Envelhecer é passar da paixão para a compaixão.

Os antigos filósofos pensavam muito mais do que liam. Eis por que se agarravam tão tenazmente ao concreto. A invenção da imprensa modificou as coisas. Lê-se mais do que se pensa. Não temos hoje filosofia, mas apenas comentários. É o que diz Gilson ao afirmar que à idade dos filósofos que se ocupam de filosofia sucedeu a idade dos professores de filosofia que se ocupam de filósofos.

Se durante o dia o voo dos pássaros parece sempre sem destino, à noite dir-se-ia reencontrar sempre uma finalidade. Voam para alguma coisa. Assim talvez na noite da vida...

Por que sou um artista e não um filósofo? É que penso segundo as palavras e não segundo as ideias.

Instante de adorável silêncio. Os homens calaram-se. A eternidade está ali e eu esperava-a. agora posso falar. Não sei o que de melhor poderia desejar senão esta contínua presença de mim próprio em mim próprio. Não é ser feliz que desejo agora, mas apenas ser consciente. Julgamo-nos separados do mundo, mas basta que uma oliveira se projete no meio da poeira dourada, bastam algumas praias resplandecentes sob o sol matinal, para que sintamos dissolver-se em nós essa resistência. Cada minuto de vida tem em si seu valor de milagre e o seu rosto de eterna juventude.

Jovem, eu pedia às pessoas mais do que elas me podiam dar: uma amizade contínua, uma emoção permanente. Hoje sei pedir-lhes menos do que podem dar: uma companhia sem palavras...

A vida é curta e é um pecado desperdiçar o tempo. Eu perco o meu tempo durante todo o dia e os outros dizem que sou muito ativo. Hoje é um momento de paragem e o meu coração parte ao encontro de si mesmo.

Mas os meus escritos sairão das minhas horas de felicidade. Mesmo naquilo que eles tiverem de cruel. Preciso de escrever assim como preciso respirar, porque o corpo mo exige.

A necessidade de ter razão marca o espírito vulgar.

As filosofias valem aquilo que valem os filósofos. Maior é o homem, mais a filosofia é verdadeira.

Cada vez que ouço um discurso político ou que leio os que nos dirigem, sinto-me apavorado por não ouvir nada que emita um som humano. São sempre as mesmas palavras que dizem as mesmas mentiras. E visto que os homens se conformam, que a cólera do povo ainda não destruiu os fantoches, vejo nisso a prova de que os homens não dão a menor importância ao próprio governo e que jogam, essa é que é a verdade, que jogam com toda uma parte de sua vida e dos seus interesses chamados vitais.

Se eu escrevesse aqui um livro de moral, teria cem paginas e noventa e nove estariam em branco. Na ultima, escreveria: “Eu apenas conheço um único dever, que é o de amar”.


Não resisti e fiz uma miscelânea de pequenas frases de alguns outros dos meus “companheiros de viagem”, autores que aprecio e que sempre que posso releio:

·         Será necessário tentar compreender o passado pelo presente, longe de tentar incessantemente explicar o presente pelo passado. (Bachelard)     

·         Meu coração é um albergue aberto toda a noite. (Fernando Pessoa)

·         Felicidade se acha é só em horinhas de descuido... (Guimarães Rosa)

·         O que um dia vou saber, não sabendo já sabia. (Guimarães Rosa)

·         O poeta e filósofo persa Al-Ghazali achava que a música – uma certa música, principalmente – é aliada ao verdadeiro conhecimento, aquele que flui de dentro do espírito, não dos livros ou das teorias. Para o poeta, a música abre as janelas do coração. De tal maneira que às vezes quem começa a ouvir a melodia não é o mesmo homem que ouve seus acordes finais (Luis Carlos Lisboa)

·         Se a música fosse apenas uma combinação de sons, não ocuparia um espaço tão grande na vida dos homens. Porque a música é uma janela do espírito, uma força capaz de envolver e transformar que a ouve, ela acompanha o ser humana na sua caminhada pelo mundo. (Luiz Carlos Lisboa)

·         A maneira mais fácil de corromper um jovem é ensina-lo a ter mais respeito por aqueles que pensam igual que por aqueles que pensam diferente. (Nietzsche)


·      Que o futuro e o mais distante sejam a causa do seu hoje. (Nietzsche)




Bruna que seu aniversário seja tudo o que você gostaria que fosse. Uma sugestão de neve ao calor, uma luz na escuridão... mas se tudo isso faltar...  só o amor já resolve!!!
Feliz Aniversário Adiantado!!

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: PENSAMENTOS QUE PENSO QUANDO NÃO ESTOU PENSANDO. RUBEM ALVES

sexta-feira, 2 de março de 2012

As lâmpadas e a inteligência







As lâmpadas e a inteligência

                Num dos meus momentos de vagabundagem, um pensamento me apareceu que fez uma ligação metafórica entre lâmpadas e inteligências que nunca me havia passado pela cabeça. Tratei, então, de seguir a trilha. As lâmpadas servem para iluminar. Para isso são dotadas de potências de iluminação diferentes. Há lambadas de 60 wattts, de 100 watts, de 150 watts, etc. Qual é a melhor lâmpada? Parece que as de 150 watts são as melhores porque iluminam mais. Também inteligências servem para iluminar. Tanto assim que se diz “tive uma ideia luminosa”!. E nos gibis, para dizer que um personagem teve uma boa ideia, o desenhista desenha uma lâmpada acesa sobre a sua cabeça. E também as inteligências, à semelhança das lâmpadas, têm potências diferentes. Os psicólogos inventaram testes para atribuir números às inteligências. A esses números deram o nome de QI, coeficiente de inteligência. Segundo as mensurações dos psicólogos, há QIs de 100, de 150, de 200... Ah! Uma pessoa com QI 200 deve ser maravilhosa! Porque, como todo mundo sabe, inteligência é coisa muito boa. Todo pai quer ter filho inteligente. Mas as lâmpadas não são objetos de contemplação. Não se fica olhando para elas. Olhamos para aquilo que elas iluminam. Uma lâmpada de 60 watts pode iluminar uma mãe dando de mamar ao filhinho. As lâmpadas valem pelas cenas que iluminam. As inteligências valem pelas cenas que iluminam. Há inteligências de QI 200 que só iluminam esgotos e cemitérios! E há inteligências modestas, como se fossem nada mais que a chama de uma vela, que iluminam o rosto de crianças e jardins. A inteligência pode estar a serviço da mote ou da vida. A inteligência, pobrezinha, não tem o poder para decidir o que iluminar. Ela é mandada. Só lhe compete obedecer. As ordens vêm de outro lugar. Do coração. Se o coração tem gostos suínos, a inteligência iluminará chiqueiros, porcos e lavagem. Se o coração gosta de crianças e jardins, a inteligência iluminará crianças e jardins. Por isso é mais importante educar o coração que fazer musculação na inteligência que iluminam a vida, por modestas que sejam.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Saco de brinquedos




Saco de brinquedos

Meu pai me contou que, quando era menino, no início do século passado,guardava seus brinquedos num saco . os brinquedos que meu pai menino guardava no saco: latas vazias, pedaços de barbante, sementes, sabugos de milho, botões, pedaços de pau, pedrinhas e todo tipo de coisas inúteis. Quando alguém aparecia para visitar a minha avó, ele pegava o saco de brinquedos e o esvaziava diante da visita. Certamente achava seus brinquedos interessantíssimos! A mãe dele ficava furiosa e aplicava-lhe o devido corretivo de chineladas depois que a visita ia embora. A chinela era um dos itens favoritos que minha avó guardava no saco de brinquedos dela.
As crianças continuam as mesmas. Ainda gostam de mostrar brinquedos. A gente  resc3e e continua criança. “Em todo homem há uma criança que deseja brincar” (Nietzsche). E todos temos o nosso saco de brinquedos. A fala somos nós abrindo o saco e despejando brinquedos...
O saco de brinquedos: isso é de fundamental quando o amor está em jogo. A paixão acontece quando, fascinados por uma imagem – pode ser um jeito de olhar, um jeito de sorrir, um jeito de falar...   – imaginamos que dentro daquele corpo de imagem fascinante estão guardados os brinquedos com que gostamos de brincar. O que vemos é a imagem da pessoa amada, mas o que imaginamos são os brinquedos que julgamos guardados dentro dela.

TEXTO RETIRADO DO LIVRO: PENSAMENTOS QUE PENSO QUANDO NÃO ESTOU PENSANDO. RUBEM ALVES