AOS QUE GOSTAM DE OUVIR A PALAVRA DE DEUS, O SENHOR DAS ESTÓRIAS... UM SILÊNCIO ESCRITO PARA ESTA NOITE...
E um jovem que se sentia desorientado lhe pediu: “Senhor das Estórias, fale-nos sobre a sabedoria...”.
Ele parou, fechou os olhos e falou pausadamente:
“Sabedoria é a arte de degustar a vida como se degusta a comida. Prova-se um aperitivo da vida com a boca e então se decide se aquilo é digno de ser comido. O sábio é um degustador. Há pessoas que têm um jeito suíno de comer: comem de tudo, sem discriminar. O degustador vai aos poucos, provando pequenos bocados. Cada bocado tem um gosto diferente. Os poemas sagrados estão cheios de pequenas experiências de degustação, coisas boas de se comer, coisas que são indignas de serem comidas. Deus não é objeto do pensamento. É objeto de degustação. Provai e vede que Deus tem gosto bom... Degustem esses aperitivos...”
“Um grão de trigo permanecerá ele só, a menos que caia na terra e morra. Morrendo, ele se transformará em muitos”.
“É preciso contar os nossos dias de tal maneira que alcancemos corações sábios”.
“Quem não muda sua maneira adulta de ver e sentir e não se torna como criança jamais será sábio”.
“Se o seu inimigo bater na sua face direita, volte-lhe também a esquerda. Não se pode vencer o mal com o mal. Só se vence o mal com o bem. Assim, se o seu inimigo tiver fome, dê-lhe de comer”.
“Se tiver sede, dê-lhe de beber”.
“Ninguém jamais viu a Deus. Sabemos que estamos em Deus se nos amarmos uns aos outros”.
“Mais vale visitar a casa em luto do que a casa em festa, porque ali o desfecho de cada homem vem à consciência de quem vive”.
“Um coração alegre aformoseia o rosto, mas um espírito abatido resseca os ossos”.
“Há amigo que é mais fiel que um irmão”.
“Quem ama o dinheiro jamais se sentirá satisfeito. Doce é o sono do trabalhador, quer coma pouco, quer muito. Mas a fartura dos ricos não os deixa dormir. Melhor é ir a um velório que ir a um banquete. Porque no velório se vê o fim de todos os homens. Melhor é a tristeza que o riso. Porque com a tristeza do rosto se faz melhor o coração. Não sejas demasiadamente justo nem demasiadamente sábio, para que não destruas a ti mesmo”.
“Mais vale um cão vivo que um leão morno, porque para aqueles que estão vivos ainda há esperança. Os vivos sabem que vão morrer, mas os mortos não sabem coisa alguma, nem tampouco terão eles recompensa, porque a sua memória jaz no esquecimento. Porque a vida são brumas e espumas”.
“A corrida não resulta da agilidade. Nem da vontade, a batalha. Nem da sabedoria, o ganha-pão. Nem da habilidade, a riqueza. Nem do saber, a estima. Para tudo há o concurso do tempo e do acaso. Além disso, os homens desconhecem a sua hora. Como peixes colhidos numa rede funesta, como pássaros presos na armadilha, assim são colhidos pelo tempo nefasto que lhes sobrevém de improviso”.
“Basta uma mosca morta para estragar o unguento do perfumista. Assim, uma pequena tolice pesa mais que a sabedoria e a honra”.
“Aquele que não se farta de riquezas, não consegue conciliar o sono”.
“O choro pode durar toda uma noite, mas a alegria vem pela manhã”.
“Os que semeiam com lágrimas, com alegria ceifarão”.
“E serás como um jardim regado, uma fonte cujas águas correm sempre”.
“Um ultimo aviso: escrever livros e mais livros não tem limite. E o muito estudo é enfado da carne...”.
O Senhor das Estórias ficou em silêncio e sorriu para o jovem.
TEXTO RETIRADO DO LIVRO “ PERGUNTARAM-ME SE ACREDITO EM DEUS” DE RUBEM ALVES. PÁG 159.