domingo, 20 de fevereiro de 2011

Sobre o Perdão...



Sobre o Perdão...

"Não sei se se deve perdoar sempre. Como perdoar o torturador? Como perdoar o adulto que espanca uma criança? Como perdoar a Inquisição, os campos de concentração, a bomba atômica, os homens públicos que se enriquecem à custa do dinheiro do povo que sofre e morre? Quem perdoa tudo é porque não se importa com nada".

Rubem Alves - Ostra Feliz não faz Pérola, Pág 200.



" Ostras são moluscos, animais sem esqueleto, macias, que representam as delícias dos gastrônomos. Podem ser comidas cruas, com pingos de limão, com arroz, paellas, sopas. Sem defesas - são animais mansos -, seriam uma presa fácil dos predadores. Para que isso não acontecesse, a sua sabedoria as ensinou a fazer casas, conchas duras, dentro das quais vivem. Pois havia num fundo de mar uma colônia de ostras felizes porque de dentro de suas conchas saía uma delicada melodia, música aquática, como se fosse um canto gregoriano, todas cantando a mesma música. com uma exceção: de uma ostra solitária que fazia um solo solitário. Diferente da alegre música aquática, ela cantava um canto muito triste. As ostras felizes se riam dela e diziam: "Ela não sai da sua depressão..." Não era depressão. Era dor. Pois um grão de areia havia entrado dentro da sua carne e doía, doía, doía. E ela não tinha jeito de se livrar dele, do grão de areia. Mas era possível livrar-se da dor. O seu corpo sabia que, para se livrar da dor que o grão de areia lhe provocava, em virtude de suas aspereza, arestas e pontas, bastava envolvê-lo com uma substância lisa, brilhante e redonda. Assim, enquanto cantava seu canto triste, o seu corpo fazia o trabalho - por causa da dor que o grão de areia lhe causava. Um dia, passou por ali um pescador com o seu barco. Lançou a rede e toda a colônia de ostras, inclusive a sofredora, foi pescada. O pescador se alegrou, levou-as para casa e sua mulher fez uma deliciosa sopa de ostras. Deliciando-se com as ostras, de repente seus dentes bateram num objeto duro que estava dentro da ostra. Ele o tomou nos dedos e sorriu de felicidade: era uma pérola, uma linda pérla. Apenas a ostra sofredora fizera uma pérola. Ele a tomou e deu-a de presente para sua esposa.
      Isso é verdade para as ostras. E é verdade para os seres humanos. No seu ensaio sobre O nascimento da tragédia grega a partir do espírito da música, Nietzsche observou que os gregos, por oposição aos cristãos, levavam a tragédia a sério. Tragédia era tragédia. Não existia para eles, como existia para os cristãos, um céu onde a tragédia seria transformada em comédia. Ele se perguntou então das razões por que os gregos, sendo dominados por esse sentimento trágico da vida, não sucumbiram ao pessimismo. A resposta que encontrou foi a mesma da ostra que faz uma pérola: eles não se entregaram ao pessimismo porque foram capazes de transformar a tragédia em beleza. A beleza não elimina a tragédia, mas a torna suportável. A felicidade é um dom que deve ser simplesmente gozado. Ela se basta. Mas ela não cria. Não produz pérolas. São os que sofrem que produzem a beleza, para parar de sofrer. Esses são os artistas. Beethoven - como é possível que um homem completamente surdo, no fim da vida, tenha produzido uma obra que canta a alegria? Van Gogh, Cecília Meireles, Fernando Pessoa..."

Rubem Alves, Ostra Feliz não faz pérola - pág 11.


A gente tem a mania de dizer que perdoamos um mal que a pessoa nos fez, uma mágoa que nos fizeram. As vezes temos que perdoar a nós mesmos, porque no fim, temos raiva e culpamos a nós mesmos. Sempre fui cristã e, por isso a eterna mania de achar que tudo vai ser lindo no fim e por isso aceitar o presente, as tristezas, as dores... Hoje sei que o melhor a se fazer é transforma-las em beleza. É aprender com as feridas e aceitar as cicatrizes. Não tem como a gente machucar o joelho numa queda forte, dar ponto e sair sem uma cicatriz. Ela fica lá pra lembrar o que não fazer pra cair daquele jeito de novo, mesmo sabendo da probabilidade de que isso aconteça novamente. Hoje eu sei que as vezes é bom cair, é bom produzir pérolas, a felicidade se basta mas não produz nada, não ensina nada.
Se me perguntarem como estou depois de uns bons tombos e quedas eu digo a você que estou terminando de fazer meu colar de pérolas...

Beijos..

Isabella


Ps: Passei na segunda etapa da bituca... E la vou eu com minhas pérolas...

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